domingo, 14 de setembro de 2014

Escola de Pais

Gostaria de iniciar a coluna fazendo um pedido especial: se desejarem ser pais ou mães, preparem-se para isso tanto quanto se preparariam para assumir um cargo de uma responsabilidade singular: o cargo de suas vidas!

Infelizmente, não temos vestibular para maternidade e paternidade, sem contar que, organicamente, podemos sê-lo praticamente crianças, mas isso não nos dá o direito de colocarmos uma vida no mundo. Porque ser mãe ou pai vai além de termos capacidade de gerar e suprir financeiramente uma criança. Precisamos ter capacidade de provê-la emocionalmente. Para isso, é necessário estarmos inteiros, imunes à corrosão de nossas frustrações.

Estamos vivendo uma nova era em relação às mais diversas áreas. A maioria esmagadora da população adulta sai para trabalhar, portanto, tem menos tempo para questões do cotidiano doméstico – e se inclui aí, tempo para os filhos. Isso tem uma repercussão quase que imediata no desenvolvimento emocional e até mesmo educacional das crianças. Porém, o que realmente merece um olhar ainda mais atento é a somatização de todas essas “repercussões” e o que isso pode ocasionar em um futuro (não tão distante).

Já é sabido, pela maioria das pessoas, que qualidade de tempo não se mede pela quantidade de horas que passamos com os pequenos, mas, sim, por toda a dedicação e troca que fazemos nas poucas horas que estamos juntos. No entanto, da mesma maneira que não se faz um bom estudante ou bom profissional sem perseverança, também não se fazem bons pais sem a dedicação de tempo. E essa tomada de responsabilidade para si, que pais conscientes devem fazer, não auxilia apenas a criança, mas também os próprios pais.

A personalidade, o caráter e os valores sociais e culturais se formam, em grande parte, na infância. Portanto, essa terceirização generalizada das crianças terá consequências sérias. Nós, profissionais das áreas de educação e psicologia, já sentimos.

A oferta de referências de comportamento, o estabelecimento de limites e bons hábitos, a preparação para a autonomia, o ensinamento de tarefas simples e indispensáveis, a criação de uma rotina e o estímulo à socialização saudável são apenas algumas das responsabilidades de pais e mães que, ausentes em presença física, legitimam sua irresponsabilidade diante do compromisso com uma vida. E a negligência de hoje cobrará juros altíssimos amanhã.

Temos assistido a um número preocupante de crianças sendo encaminhadas a atendimentos especializados não por causas orgânicas e genéticas, mas em função de um meio empobrecido de estímulos, regras e organização. Não é pequena a porcentagem de vezes que precisamos, mais do que organizar a vida da criança, auxiliar os pais nessa estruturação. Mas o mais adequado seria, sem dúvida, fazermos isso anteriormente à existência desse pequeno ser. Se progredirmos em tantos âmbitos, prevendo acontecimentos dos mais variados, por que temos de expor um outro ser humano a experiências? Nos preparamos para uma entrevista, para um primeiro encontro, para uma banca de mestrado, até para irmos ao médico! Então, por que não nos preparamos para encarar essa jornada encantadora e, ao mesmo tempo, árdua, com integridade, retidão, lisura e prazer (que também é indispensável)? Mais do que as crianças, os pais estão precisando de escola.

Créditos: Jornal Zero Hora Edição n° 17914 de 06 de setembro de 2014 - Por Lisandra Pioner

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